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Foto do escritorMarina Tipo Ruim

Diabetes vai além de aplicar insulina, medir a glicose e saber os resultados da glicada...


Longe de mim julgar uma mãe. Muito mais longe de mim julgar uma mãe de uma criança DM. Mas tem coisas que é preciso abrir os olhos.

Eu estava sentada na unidade do Tenente Pena esperando minha vez, mexendo no celular. Olho no whatsapp, olho na senha, e nesse sobe e desce de olhar, meus olhos se depararam com uma menina, parada de pé na minha frente, muda, e querendo começar a chorar.

Nos 3 primeiros segundos pensei que ela estivesse perdida, depois pensei que ela estivesse com dor....mas daí ela falou com a voz embargada "Vc é a Tipo Ruim?" e eu só acenei com a cabeça afirmando q sim. Ela começou a chorar e imediatamente me abraçou.

Ok. Entendi. É uma fã do blog.

Beijos Beijos, selfie, abraço, e ela me deu a mão! A mãe chegou mais perto e me deu um oi de longe...meios em graça.

Normalmente isso não acontece...

O painel mudou de senha, e era a senha delas. A mãe chamou-a pra ir pegar os insumos e ela pediu para ficar comigo só mais um pouco, e a mãe deixou.

Foi ai que tudo aconteceu...

Ela olhou pra mim, apertou forte a minha mão e disse "Minha mãe é nutricionista, e ela acha que eu sou feliz comendo as coisas que ela faz. Eu não posso nunca comer macarrão. Fazem 4 anos que não como pão. Sinto falta dessas coisas. No natal a minha comida é diferente, e eu fico esperando ansiosamente meu aniversário só para poder comer 2 garfos de bolo normal. Me sinto presa. Pesquisei na internet sobre a contagem de carbo, a gente faz, mas ela me diz que só serve para fazer nas comidas naturais, mas eu vejo pessoas como vc comendo tudo, e fazendo a contagem. Não aguento mais isso, nem essa vida. Ela não me escuta. Não quero ser como ela, não acredito nisso e tenho raiva. O pior momento do meu dia são as refeições, quero chorar em todas."

................... Vou fazer uma pausa aqui para vc poder digerir esse pedido de socorro.................

. . . . . . . . . Eu não tive esse tempo que eu te dei. Ela simplesmente vomitou tudo isso e eu tive que imediatamente pensar em alguma coisa para falar. E então eu disse "Querida, normalmente os pais sabem exatamente o que é o melhor pra nossa vida, mas algumas vezes eles se enganam. Tenho certeza que sua mãe está fazendo o melhor que ela pode por você. Tente entender o medo que ela sente de te perder para essa doença, pode ser por isso que ela esteja agindo dessa forma. Tente conversar com ela, exponha isso tudo que vc me falou, mostre pra ela q vc nao está feliz e eu tenho certeza q vcs duas vão se acertar e as coisas vão melhorar."

Então ela disse "A única vez que eu tentei falar sobre o que eu sentia eu fiquei de castigo 2 meses..."

A mãe dela chegou, deu um sorriso pra mim, e eu senti as mãozinhas dela escorregarem pelos meus dedos.

Fiquei olhando ela caminhar até sumir do alcance dos meus olhos.

Eu não pude ajudar, não pude e não posso. Nem sei como encontrar ela para poder sequestrar essa menina e levar ela pra minha casa.

O que eu posso fazer por você? (se vc estiver lendo esse post)

Eu posso usar o meu blog para escrever sua história, tão resumida, tão pequena diante do que ela deve ser de verdade.

Posso tentar alertar as mães para que escutem os gritos abafados de socorro dos seus filhos. Parem e olhem de verdade para os seus pequenos. Eles sofrem muitas vezes em silêncio.

Saiam desse automático robotizado de dizer que eles são normais, saiam desse automático de dizer que está tudo bem, de pensar que vc pode passar por cima de uma doença tão pesada sem conversar, sem dar carinho. Eles (a gente) precisam de muito mais do que doses de insulina e medições feitas no meio da madrugada. Isso é a sua obrigação de pai, cuidar tecnicamente do seu filho é uma questão fácil que só exige esforço físico. Vá para o lado onde vc será exigido por amor, por sentimento, dedicação. Seja mãe, Seja pai. Cuide. Converse. Observe. Perceba se algo não vai bem.

Essa menina tem um potencial gigante de desenvolver um transtorno alimentar na vida adulta. No primeiro momento que ela se ver livre da mãe, no seu primeiro emprego, ela vai entrar numa padaria e vai comer compulsivamente. Deus queira que não, mas não consigo pensar em um final feliz para essa história nutricionalmente abusiva.

Quando ela puder escolher o que vcs acham que ela vai escolher? Não sejamos cegos achando que ela vai entender que o melhor é uma alimentação restritiva. Essa menina vai despirocar na primeira padaria que ela entrar com o dinheiro do estágio dela. E isso é triste.

Diabetes vai além de aplicar insulina, medir a glicose e saber os resultados da glicada..... Diabetes definitivamente NÃO te dá uma vida normal, não chegamos nem perto disso quando o que se está avaliando é o lado emocional da doença. A tecnologia facilita muito a nossa vida, perto do que acontecia há 30 anos atrás hoje vivemos no paraíso diabético....mas emocionalmente não nos desenvolvemos quase nada....continuamos tratando os doentes com restrição, continuamos tratando apenas a doença física, continuamos não tendo compaixão....

Nos 3 primeiros segundos pensei que ela estivesse perdida, depois pensei que ela estivesse com dor, então percebi que ela estava perdida E com dor.....

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